sexta-feira, 15 de junho de 2018

Estímulo cerebral pode tratar depressão e compulsão por comida



A estimulação cerebral profunda não é um tratamento novo e ainda é muito controverso. Ela surgiu em 1930, quando o neurocirurgião Wilder Penfield desenvolveu a técnica para tratar a epilepsia. Durante o procedimento, era realizado o estímulo de diferentes partes do cérebro com uma sonda elétrica. A ideia era manter os pacientes acordados durante o processo, para que os médicos pudessem entender o efeito do estímulo, identificar o problema e destruir a área problemática.
No mesmo período, o neurologista Antonio Egas Moniz trabalhava na retirada de pequenas partes do lobo frontal do cérebro de seus pacientes, área vital para o planejamento e a personalidade da pessoa. A retirada e observação dessas partes do cérebro foram essenciais para o estudo e a prática da estimulação cerebral, permitindo que neurologistas compreendessem que áreas do cérebro podem ser beneficiadas com os eletrodos. O procedimento foi considerado bem sucedido em vários casos e lhe rendeu um Prêmio Nobel em 1949.
Em 2002, a estimulação cerebral foi aprovada para o tratamento do mal de parkinson e já foi realizada em mais de 40 mil pacientes. A aprovação desse procedimento para doentes com parkinson abriu precedente para a utilização da técnica em pessoas com outros distúrbios, como a depressão severa. Neste caso, a região estimulada é o núcleo accumbens, área de recompensa do cérebro que é responsável por processar o prazer. O accumbens está ligado à depressão porque pessoas depressivas têm um interesse reduzido pelo prazer. 
Thomas Munte, neurologista da Universidade de Lubeck, na Alemanha, tem usado a técnica em pacientes com depressão severa e alguns com obesidade, que não têm resultados com outros tratamentos. Na paciente Anna, a estimulação ajudou a conter a depressão consideravelmente e a fez perder quase 50% a mais de peso por mês (2,8 kg), do que ela havia perdido após a cirurgia bariátrica. O neurologista afirma que o alvo inicial era tratar a depressão e que a perda de peso era o segundo objetivo a ser atingido. 
Munte explica que algumas pessoas são obesas devido à uma alteração no sistema de recompensa do cérebro. Segundo o especialista, existem obesos que apresentam diferentes padrões cerebrais quando estão diante de imagens de comidas gostosas em relação a pessoas magras. A teoria é que o núcleo accumbens leva pessoas viciadas ao seu objeto de desejo, podendo ser comida, álcool ou drogas. 
O método utilizado para impedir uma área do cérebro de realizar sua função ainda é uma teoria não comprovada, porém ganha força graças a um famoso estudo com ratos feito em 1950. "Às vezes, na medicina, você começa a fazer (procedimentos) antes de sequer saber exatamente como funciona", afirma Munte. No caso do mal de Parkinson, a estimulação cerebral profunda provou ter um impacto positivo muito maior na qualidade de vida do que outros tratamentos. Talvez, em breve, seja possível comprovar os impactos positivos no tratamento da depressão e até obesidade.
Atualmente, existem 650 milhões de adultos e 340 milhões de crianças e adolescentes atualmente considerados obesos no mundo. A obesidade contribui para a morte de cerca de 2,8 milhões de pessoas por ano em todo o mundo.
Contudo, Munte ressalta que a estimulação cerebral não deve ser aplicada como tratamento generalizado para a obesidade. Essa técnica deve ser o último recurso a ser utilizado, uma vez que trata-se de um procedimento caro e invasivo. Ela só é indicada em pacientes obesos com tendências aditivas (vício) em relação à comida. No caso de Anna, ela tinha uma dupla indicação para a realização da estimulação cerebral profunda, pois tinha depressão severa não solucionada com uso de antidepressivos e tendências aditivas em relação a comida, diagnosticadas a partir de vários questionários.
Com o uso mais frequente de medicamentos como antipsicóticos e antidepressivos, o uso dessas técnicas invasivas e irreversíveis foi reduzido, no entanto a contribuição trazida com o estímulo dessas áreas cerebrais foi importante para o avanço da estimulação cerebral. Embora não possa ser aplicado na maioria dos pacientes, os resultados positivos da utilização do método demonstram que, nos casos mais severos, esse tipo de tratamento pode ser a única saída para salvar vidas.
Fonte: BBC Future

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