quinta-feira, 21 de junho de 2018

Artigo: As controvérsias no diagnóstico e no atendimento aos autistas

Por Elano Figueiredo
Advogado especialista em saúde

Nos últimos 20 anos, o número de diagnósticos de autismo cresceu assustadoramente. Isto fez com que os profissionais de saúde conferissem mais atenção ao assunto. Novos critérios para o reconhecimento clínico e os mais diversos métodos de tratamento inundaram a sociedade com esperanças, mas também com muitas dúvidas sobre a eficácia dos mesmos.
O Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode ser caracterizado por desafios com habilidades sociais, comportamentos repetitivos, fala e comunicação não-verbal. O autismo é um dos transtornos que integram esse quadro.
Em 2002, nos Estados Unidos, uma pessoa em cada 150 era autista. Hoje, estima-se que a proporção é de uma para 51. A fonte é o Centro Norte-Americano de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).
No Brasil, não é muito diferente: já são mais de 2 milhões de autistas. E, seguindo esta proporção nacional, pode-se estimar uma população exposta superior a 90 mil autistas em Pernambuco.
O que também chama muita atenção aqui no Estado é o extraordinário número de ações judiciais reivindicando o tratamento para esta síndrome. Já atinge um percentual de 11% dos litígios contra convênios. A cada 10 ações ajuizadas no segmento, uma é sobre TEA.
Tudo isto tem desafiado a comunidade científica a estudar se estamos diante de uma "epidemia” de autismo. Mas a resposta para isto é negativa. Os especialistas no assunto concluíram que os métodos de diagnóstico evoluíram e a quantidade oficial de autistas cresceu em decorrência deste efeito.
Por outro lado, também perceberam que diversos profissionais estão, equivocadamente, apontando como portadores de TEA as crianças que sofrem de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), de Síndrome de Ansiedade e outras neuropatias que alteram o comportamento dos infantes.
A situação é preocupante, porque o tratamento para cada distúrbio desta natureza é específico e, quanto mais precoce, mais importante para o desenvolvimento do paciente. Uma criança com TDAH diagnosticada como TEA, ou ao contrário, vai receber atendimento inadequado.
Em determinadas ações judiciais, é possível constatar diagnósticos precipitados, em análises superficiais. E o pior: percebe-se um padrão de tratamento, como se houvesse uma receita pronta para enfrentar o TEA. Só que não há.
Determinada neuropediatra chega a indicar os métodos de cuidados psicológicos aos quais seus pacientes devem se submeter, quando, na verdade, isto seria prerrogativa profissional da psicóloga.
Há clínicas e profissionais divulgando serem especialistas em ABA, HANEM, PECS, TEACCH, INTEGRAÇÃO SENSORIAL, quando estas abordagens são métodos de terapia, sequer subespecialidades. Ainda não há título de especialização reconhecido pelos Conselhos – nem de Medicina e nem de Psicologia.
Então, tais anúncios dão a falsa impressão que apenas determinados psicólogos, fonoaudiólogos e fisioterapeutas estariam preparados para tratar o TEA. Não é verdade.
Baseados nos relatórios emitidos por estes profissionais, o Poder Judiciário vem determinando ao Estado e aos planos de saúde o custeio de tratamentos de eficácia duvidosa, entre os quais estão ainda medidas de reforço pedagógico/escolar, que não se enquadram como cuidado clínico.
Com efeito, o tratamento indicado para autismo é o uso de Terapia Comportamental (TC). “É o único tratamento baseado em evidência científica”, segundo Martha Hubner, professora do Instituto de Psicologia da USP.
Aqui em Pernambuco é preciso, urgentemente, promover o debate sobre o assunto, tanto na esfera das autoridades de saúde como no meio jurídico. Existem erros clínicos que fundamentam liminares. Há um desvirtuamento do conceito de especialista. Muita gente ganhando fábulas de dinheiro com serviços de eficácia duvidosa. E, no centro de tudo isto, nossas crianças autistas podem estar recebendo tratamento inadequado.
*Os artigos publicados no Blog Saúde e Bem Estar são escritos por especialistas convidados pelo domínio notável na área de saúde. As publicações são de inteira responsabilidade dos autores, assim como todos os comentários feitos pelos leitores/internautas.

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