terça-feira, 10 de julho de 2018

A controvérsia da Ozonioterapia: especialistas e instituições divergem quanto aos benefícios



Já utilizada em países como a Alemanha, a Ozonioterapia tem gerado polêmica e divergência entre instituições e especialistas brasileiros. De um lado, a Associação Brasileira de Ozonioterapia (Aboz), que afirma que o ozônio medicinal já é utilizado há décadas em países desenvolvidos e seus benefícios já foram comprovados por inúmeros estudos. De outro, o Conselho Federal de Medicina (CFM) repudia o uso terapêutico do ozônio, uma vez que considera ser um procedimento com estudos científicos embrionários. 
A Ozonioterapia é uma técnica terapêutica que utiliza uma mistura dos gases oxigênio e ozônio para o tratamento de diversas doenças, podendo ser aplicada por várias vias de administração, endovenosa, retal, intra-articular, local, intervertebral, intraforaminal, intradiscal, epidural, intramuscular e intravesical. No entanto, a sua utilização ainda é controversa no Brasil.
Uma pesquisa recente divulgada pelo Saudi Journal of Biological Sciences (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5935866/#!po=0.819672) sobre o uso da ozonioterapia para a osteoartrite (OA), relata que a terapia com ozônio tem mostrado resultados positivos no tratamento dessa enfermidade e de doenças degenerativas. Mas ressalta em sua conclusão a necessidade de mais estudos in vitro para entender o mecanismo da ação da substância nas células. 
“A terapia com O3 é uma terapia eficiente no tratamento da cartilagem articular danificada na OA. O3 inibe o meio inflamatório que danifica a matriz da cartilagem e induz a apoptose dos condrócitos na OA. Produz seus efeitos benéficos através da normalização do balanço redox celular e das ações das citocinas. Mais estudos in vitro são necessários para entender os mecanismos exatos envolvidos na estimulação das células pelo O3” (tradução livre).
Segundo a Aboz, a prática tem ação anti-inflamatória, antisséptica, modulação do estresse oxidativo e melhora da circulação periférica e da oxigenação. Sendo indicada para o tratamento de diversas doenças inflamatórias, infecciosas e isquêmicas, prolongando a qualidade de vida de pacientes, a exemplo do câncer, problemas circulatórios, doenças virais, como hepatite, diabetes e dores articulares decorrentes de inflamações crônicas.
Projeto de Lei
A aprovação do Projeto de Lei nº 227/2017 no Senado que autoriza a prescrição da técnica no Brasil vem gerando discussões na comunidade médica. Em dezembro de 2017, o CFM chegou a divulgar uma nota de repúdio à lei, com o apoio de 24 entidades médicas de representação nacional, argumentando que o uso da ozonioterapia sem comprovação de sua eficácia e segurança coloca em risco pacientes, retardando o início de tratamentos eficazes e já com a devida verificação, comprometendo assim a saúde dos mesmos.
De acordo com Arnoldo de Souza, presidente interino da Aboz, a técnica existe há mais de um século, tendo sido iniciada na Alemanha, onde já é reconhecida pelos órgãos de saúde e oferecida pela rede pública desde a década de 80. “O ozônio, ao entrar em contato com os fluidos humanos, gera reações que melhoram a circulação, alteram o metabolismo e melhoram o processo de combate aos radicais livres”, explica.
Maria Emília Gadelha, presidente da Aboz, argumenta que, além dos benefícios à saúde, o uso do ozônio medicinal pode reduzir entre 20% e 80% os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS) e que o método não progride no país porque vai contra os interesses da indústria farmacêutica e de material médico hospitalar.
Ministério da Saúde passa a oferecer a Ozonioterapia 
Em março deste ano, o Ministério da Saúde passou a ofecerer a prática pelo SUS como parte das novas Práticas Integrativas e Complementares (PICS), que têm como objetivo auxiliar o tratamento convencional. O credenciamento da prática complica ainda mais a questão, uma vez que é disponibilizada pelo SUS, mas o órgão de regulação da categoria médica proibe o procedimento.
Resolução do CFM
O Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou a Resolução nº 2.181/2018 que determina que o uso terapêutico do ozônio só deve ser feito em caráter experimental, ou seja, apenas com finalidade de estudos, observando os critérios definidos pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). A nova resolução proibe os médicos de prescreverem esse tipo de procedimento fora do âmbito da pesquisa. O desrespeito à norma pode levar à abertura de sindicâncias e de processos éticos-profissionais por parte da entidade.
O CFM alega que as pesquisas existem, porém os trabalhos são incipientes e não utilizam uma metodologia adequada. O Conselho afirma que a determinação se baseia na análise de mais de 26 mil trabalhos sobre o tema. De acordo com o relator da Resolução e conselheiro da entidade, Leonardo Luz, os trabalhos ainda são incipientes e não oferecem aos médicos e aos pacientes a certeza de que a ozonioterapia é eficaz e segura. Ele entende que “seriam necessários mais estudos com metodologia adequada e comparação da ozonioterapia a procedimentos placebos, assim como estudos comprovando as diversas doses e meios de aplicação de ozônio”.
Divergência entre especialistas
O desacordo se dá também no âmbito da atuação dos profissionais de saúde, sobretudo, médicos. O hepatologista Fábio Marinho afirma de maneira sucinta que desconhece qualquer benefício do tratamento com ozônio para pacientes com hepatite C. “Desconheço qualquer benefício neste sentido”, declara o especialista do Real Hepato. Edmundo Lopes, hepatologista do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), também ignora qualquer tipo de comprovação científica do uso terapêutico do ozônio em pacientes com hepatite. “Nunca ouvi falar em comprovação científica para tratamento da hepatite C com ozonioterapia”, afirma.
Para o especialista em dor crônica, Leandro Braun, já existem evidências bem consistentes das vantagens da ozonioterapia nos tratamentos ligados à área musculoesquelética. “Posso falar em relação a minha área que é ligada à dor crônica e musculoesquelética. Já existem evidências grandes e bastante razoáveis dos benefícios dessa terapia para problemas de coluna, artro artrose de joelho, osteoartrose”, defende o médico. 
Carolina Matias, oncologista do Real Instituto de Oncologia, afirma que não existem estudos na literatura médica comprovando a eficácia da ozonioterapia no tratamento do câncer. “Todo tratamento que usamos tem que ser baseado em estudos clínicos, que comparam algum tratamento novo ao tratamento padrão já existente. Não há nenhum estudo de ozonioterapia no tratamento de câncer na literatura médica, por isso não podemos dizer que tem alguma eficácia, nem também dizer seus efeitos colaterais. Primeiro tem que se fazer estudos pré-clínicos (por exemplo em ratos), mostrando alguma eficácia anti tumoral e depois temos diversas fases de estudos em humanos (fase 1,2,3) e não temos nada disso com a ozonioterapia”, explica.
Repercussão na imprensa
A ozonioterapia tem sido bastante discutida pela imprensa brasileira nos últimos anos. No último domingo, o programa Fantástico da Rede Globo levou ao ar uma matéria alertando sobre os riscos do uso da ozonioterapia por profissionais que prometem a cura de diversas doenças. No dia 10 de dezembro de 2010, a emissora já havia exibido uma matéria no Jornal Nacional falando sobre uma pesquisa com ozônio, realizada pelo Hospital das Clínicas de São Paulo, que poderia destruir bactérias resistentes aos antibióticos, eliminando as bactérias e ajudando na cicatrização.
Segundo a reportagem, os pesquisadores haviam descoberto que a substância poderia destruir até a superbactéria KPC, bactéria super resiste que os antibióticos não conseguiam destruir e que provocou várias mortes por infecção. De acordo com o coordenador do estudo, Glaucus de Souza Brito, “a descoberta pode mudar completamente o cenário do controle das bactérias hospitalares de maneira simples, barata e acessível em qualquer hospital do país”, relata.

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