O glúten é uma proteína
presente no trigo que tem a função de dar liga nos alimentos. Esta proteína
está presente no trigo, centeio, malte, cevada e, às vezes, na aveia. Para uma
parcela da população, o glúten pode causar sérios problemas à saúde, desde
reações no trato gastrointestinal, pele, sistema respiratório, anemia,
depressão e até danos cerebrais. Doença Celíaca (DC), alergia ao glúten e Síndrome
do Intestino Irritável (SII) são algumas das doenças glúten-relacionadas que
acometem muitas pessoas em todo o mundo.
Para explicar a diferença
entre essas condições, o Blog Saúde e Bem Estar entrevistou a gastroenterologista
Margarida Castro Antunes, para esclarecer à população sobre sintomas,
diagnóstico, tratamento e prevenção. Confira a entrevista completa:
SBE:
Qual
a diferença entre as três doenças?
Margarida
Castro Antunes: São três condições com causa, diagnóstico
e tratamento bastante diferentes, mas que podem ter sintomas semelhantes ou
parecidos.
A síndrome do intestino
irritável é uma desordem que ocorre com dor abdominal acompanhada de diarreia,
constipação ou alternância entre esses dois sintomas. Não é uma verdadeira
doença, mas um distúrbio da movimentação e da sensibilidade do intestino e pode
estar relacionada a estados ansiosos e estresse.
A doença celíaca é uma
doença autoimune desencadeada pelo glúten da dieta e pode ser confundida com a
SII. Por esse motivo todo paciente com SII deve fazer exame de sangue para
investigar doença celíaca.
Alergia a trigo é uma
reação alérgica que cursa mais com sintomas respiratórios e de pele. Por fim,
algumas pessoas sem doença celíaca podem se sentir mal quando comem glúten, por
dificuldade de fazer a digestão dessa proteína e são chamados portadores de
intolerância ao glúten não celíaca.
SBE:
Como
é possível distingui-las na hora de fazer o diagnóstico?
Margarida
Castro Antunes: O diagnóstico dessas doenças é muito
complexo e por isso deve ser feito, obrigatoriamente, por médico gastroenterologista
por meio de exames de sangue especiais e em alguns casos endoscopia digestiva. Para
os exames serem confiáveis devem ser feitos em consumo de glúten, pois eles
negativam após a retirada do mesmo e, algumas vezes, demoram até dois anos para
positivar novamente. Nesse contexto, as pessoas que decidem retirar o glúten da
sua dieta por motivos pessoais ou para controle de peso devem realizar a avaliação
para doença celíaca (que é diferente do de alergia a glúten) antes de iniciar a
dieta.
SBE:
Qual
a frequência dessas enfermidades na população?
Margarida
Castro Antunes: No Brasil, estima-se que até 1% da
população tenha DC, semelhante ao que ocorre em outros locais do mundo. A síndrome
do intestino irritável é mais comum e pode acometer ate 15% de crianças em
idade escolar. Já a alergia ao trigo é rara no Brasil e não há dados, ainda,
sobre a frequência da intolerância ao glúten não celíaca.
SBE:
A
doença celíaca está associada a algum fator de risco?
Margarida
Castro Antunes: Os fatores de risco são genéticos e
ambientais. Os genéticos são múltiplos e o mais conhecido que é o HLA não
explica a ocorrência da doença. Ou seja, cerca de 40% da população é portadora
dos genes HLA para doença celíaca, mas apenas 1% tem a doença. Por esse motivo,
na atualidade o exame genético não tem utilidade para o diagnóstico da enfermidade.
Hoje se sabe que outros genes (ou grupos de genes) estão atuando em conjunto de
forma complexa para que o indivíduo desenvolva a DC.
Alguns fatores ambientais
também podem interferir no desenvolvimento tais como: nascer de parto cesárea,
usar antibiótico no início da vida, idade da introdução do glúten na
alimentação da criança (antes dos 4 ou após os 7 meses de vida). Mas, a maioria
dos estudos ainda não consegue determinar se esses são fatores que farão com
que o indivíduo desenvolva a doença ou apenas que o início dela seja mais
precoce na vida.
SBE:
Existe
algum grupo de risco mais suscetível de ser acometido pela doença celíaca?
Margarida
Castro Antunes: A doença celíaca pode acontecer em
qualquer idade. Diz-se no meio médico que a pessoa não nasce com a doença, ela
desenvolve. Alguns grupos são considerados de risco para a DC, entre eles:
familiares de primeiro grau de indivíduos celíacos, diabéticos tipo I (usuários
de insulina), pessoas com Síndrome de Down, portadores de outras doenças
autoimunes (como tireoidite) e pessoas com imunodeficiência.
SBE:
Como
é feito o tratamento em cada caso? Existe cura?
Margarida
Castro Antunes: O tratamento é feito com a retirada total
do glúten da dieta por toda a vida. Considerando-se que cura é a ausência de
doença, o individuo celíaco sem glúten está curado. Existe uma máxima que diz
que “O celíaco é uma pessoa normal que não pode consumir glúten”.
SBE:
Como
prevenir?
Margarida
Castro Antunes: Até o momento não existe uma forma
conhecida de prevenir completamente a doença celíaca. Mas evitar parto cesáreo
e uso de antibiótico desnecessário tem o potencial de diminuir a frequência da
DC na população.
SBE:
Quais
as principais complicações associadas à doença celíaca?
Margarida
Castro Antunes: O celíaco não tratado, ou com tratamento
inadequado tem risco aumentado de osteoporose, infertilidade e câncer. Por esse
motivo o diagnóstico deve ser feito de forma correta para evitar uma dieta
inadequada e as complicações dessa conduta.
SBE:
Qual
a maior dificuldade no diagnóstico e tratamento?
Margarida
Castro Antunes: Atualmente uma das maiores dificuldades
no diagnóstico é pelo grande número de pessoas que segue dieta sem glúten,
antes de descartar a doença celíaca. Como comentado anteriormente, os exames de
sangue e biopsia normalizam rapidamente após a suspensão do glúten da dieta e
depois podem demorar muito tempo para voltar a positivar. Os exames genéticos
não contribuem para o diagnóstico. Ou seja, o indivíduo fica sem saber se tem a
doença e não inicia o tratamento correto precocemente, ficando sujeito às complicações
da doença não tratada.
SBE:
Existem
outras doenças associadas ao glúten?
Margarida
Castro Antunes: Além das comentadas anteriormente, existe
a dermatite herpetiforme, que é uma doença de pele desencadeada pelo glúten.
Margarida
Castro Antunes
Professora do Departamento
de Saúde Materno Infantil e Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente,
UFPE. Preceptora do Serviço de Gastroenterologia Pediátrica, Hospital das
Clínicas UFPE.
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