Por Elano Figueiredo
Advogado especialista em saúde
Aqui
pertinho, o Ceará vem sendo celeiro para as maiores operadoras de
saúde do Nordeste. Os dois planos surgidos ali crescem e
apresentam resultados positivos em seus balanços. Lá,
até empresa dental chegou a atingir receita líquida de R$ 100
milhões. Por que em Pernambuco o nível de reclamações no segmento é
insustentável e 21 planos de saúde deixaram de existir nos
últimos 7 anos?
O que levou empresas como
Unimed Guararapes, Ideal Saúde, Real Saúde, Meridional, Univida, Unilife e
América Saúde a fecharem às portas?
De 2010 até hoje, a Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS) registra a baixa de 21 registros de
operadoras em Pernambuco. Atualmente, a maior operadora
do Estado, ainda em atividade, possui 204.000 beneficiários, receita
de R$ 611 milhões e custo de R$ 633 milhões.
Uma realidade bem diferente
do Ceará, onde se destaca a maior empresa de planos de saúde e também
a maior cooperativa médica do Norte-Nordeste. A empresa de medicina de
grupo cearense é a terceira no ranking nacional, encerrou 2017 com quase
2,5 milhões de beneficiários. Sua receita atingiu a cifra de R$ 2,8 bilhões e
as despesas R$ 2,5 bilhões. Acabou de ser listada com sucesso na
bolsa de valores.
Já a cooperativa
alencarina reúne 330 mil consumidores, com receita anual de R$ 1,1 bilhão
e custo assistencial de R$ 1 bilhão.
Noutro ritmo, mesmo
ostentando o segundo maior polo médico-hospitalar do país -
atrás apenas de São Paulo - o consumidor de planos de saúde de Pernambuco sofre
com o insucesso dos planos assistenciais da região. Frequentemente é necessário
portar a assistência ou contratar nova empresa, diante do repetido quadro de
insolvência das companhias locais.
Para explicar a situação,
seria necessário enfrentar várias questões, tais como (i) o alto custo da
medicina de qualidade, (ii) a atuação do Conselho de Medicina no controle
da ética médica, (iii) a alta concentração de médicos no Estado,
(iv) a função histórica protecionista da ADUSEPS, (v) a carência de
recursos do consumidor da região, (vi) o papel dos advogados, (vii) a
formação local dos profissionais de direito, entre outras. Vamos
tentar demonstrar apenas o contexto panorâmico.
Para se ter ideia, um levantamento
no PJe (sistema de processos eletrônicos) do Tribunal de Justiça de Pernambuco
(TJPE) dá conta que em 2017 foram registrados 9.744 processos novos contra as
maiores empresas de saúde aqui atuantes. A previsão é que as condenações
ultrapassem a soma de R$ 140 milhões, apenas em danos morais; sem falar no
custo assistencial gerado pelas liminares em cada processo.
Há, assim, uma forte
intervenção do Judiciário nas despesas assistenciais, afetando
diretamente o equilíbrio dos contratos assistenciais. E será que em
todo litígio o consumidor tem razão?
Vale refletir alguns
exemplos: inseminação artificial (tratamento para engravidar), próteses de
silicone para sustentação estética das mamas, tratamentos não
aprovados pelo Conselho de Medicina, acompanhamento escolar para autistas,
fisioterapia domiciliar, desintoxicação em SPA, medicamentos sem registro
na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Nenhum deles está no
preço que o consumidor paga ao plano de saúde.
Então, quem paga por
estes procedimentos quando o juiz defere uma liminar? Todo mundo acha que é a
operadora de saúde, mas não é. Na verdade, o custo é rateado entre todos os
clientes da empresa. E quando estes não podem pagar, o plano se extingue. Não
tem mágica.
Está faltando, portanto,
visão de longo prazo no zelo da assistência à saúde. Os médicos, quando
abusam das prescrições. Os advogados quando estimulam o litígio. Os Juízes
quando interferem indevidamente nos contratos. O consumidor quando não enxerga
nada disto e, depois, reclama do reajuste das suas mensalidades.
Obviamente os números da
judicialização na saúde refletem sim a insatisfação geral com as
operadoras. Não se pode negar que a massificação das relações e a banalização
do humanismo vem piorando consideravelmente os serviços. Mas gritar contra
os planos é o mesmo que questionar a administração pública que
você mesmo elegeu; reclamar da corrupção quando se sonega impostos. A
solução é fiscalizar, olhar para o lado, se incomodar com os abusos, ponderar
os litígios.
A ANS estabeleceu uma
ferramenta de denúncia chamada NIP que investiga rápido e eficazmente os planos
de saúde. Ali o julgamento é técnico. Não existe o interesse no dano moral, na
comissão sobre próteses, nos honorários. O regulador vai aplicar
a mais correta regulação em saúde e a operadora pagará multas
pesadas, a partir de R$ 80 mil.
É tempo de abrir o olho,
incomodar-se e levantar para fiscalizar. Não só o plano, mas todos
os atores da saúde. O consumidor bem informado e ativo consegue gerar
a eficiência do mercado.
*Os
artigos publicados no Blog Saúde e Bem Estar são escritos por especialistas
convidados pelo domínio notável na área de saúde. As publicações são de inteira
responsabilidade dos autores, assim como todos os comentários feitos pelos
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